Por Carlos Rafael Dias
Moacir Siqueira era um personagem típico de nossa cratensidade, apesar de ter nascido em São José do Egito, Pernambuco.
Sua história com o Crato é uma verdadeira epopeia.
Com 14 anos saiu de casa, pegando um trem para outra cidade. O destino, entretanto, o trouxe para cá. Ele errou de trem na hora da baldeação.
Chegou ao Crato, garoto ainda, com a cara e a coragem, somente.
Cara e coragem de caboclo, trazendo nos ombros o peso da ancestralidade que se fez guerreira, para sobreviver o holocausto cruento de trezentos anos de colonização predadora.
Como ele disse, de maneira alegórica, limpou m... com as mãos para poder se radicar na Princesa do Cariri.
Mas sua sina o predestinara a ser um vencedor. Seja como jogador de futebol, defendendo com galhardia (ele gostava muito dessa palavra) times e a seleção do Crato, seja como empresário.
Foi um político efêmero. O destino novamente se encarregou de fazê-lo prefeito da cidade que ele adotou e que também, a duras penas, o adotara.
E foi um político e mandatário atípico. A História, nem sempre imparcial, há de lhe fazer justiça.
Agora resta a sua memória de homem íntegro, amigo, pai de família.
Tive o privilégio de ser seu amigo e de ter sido seu assessor no seu breve, mas profícuo tempo de prefeitura, na condição de secretário de Cultura.
Tenho muitos exemplos de sua grandeza. Vou me reportar a um que me tocou fundo o coração.
O poeta Luciano Carneiro, outra vítima, como ele, dessa maldita “gripezinha”, era vigilante do Museu do Crato, onde também funcionava a Secretaria de Cultura. Ele tinha passado algum tempo de licença de saúde, em decorrência de uma depressão que o acometera pela morte de um filho, vítima de um acidente de motocicleta. Retornou ao trabalho, mas não estava totalmente recuperado. Veio falar comigo. Disse-lhe que nada podia fazer, pois não tinha autoridade para tanto.
Passaram-se alguns dias e, certa noite, em um evento que realizávamos no Museu, Moacir chegou e viu o poeta de farda, no seu turno de trabalho. Moacir, então, perguntou:
- Poeta, o que você está fazendo aqui?
Luciano respondeu que estava trabalhando, pois era o vigia da repartição.
Moacir disse-lhe que “poeta é para fazer poesia”, e dispensou-lhe daquele encargo tão tormentoso, o cedendo à Morada da Poesia, gráfica da Academia dos Cordelistas do Crato, do qual o poeta Luciano Carneiro era sócio.
Na sua simplicidade, Moacir mostrou quem era e para que veio.
Agora, com certeza, está mostrando para onde vai, deixando esse conturbado mundo mais pobre de exemplos nobres como os dele.