O povo é muito mais são e sábio do que a classe instruída. Talvez
justamente por não passarem por uma escolarização emburrecedora,
destinada a embotar as capacidades cognitivas do ser humano, os
brasileiros sem instrução enxergam a realidade, inclusive e sobretudo a
realidade política, com muito mais clareza do que as pessoas com "nível
universitário" e são muito mais capazes de identificar os reais
interesses do país e posicionar-se em sua defesa.
Talvez por não haverem sido moídos por uma educação cínica e
anti-patriótica onde se ensina uma história sem heróis e onde
professores sub-marxistas tentam criar pequenos militantes facilmente
manobráveis, os brasileiros sem instrução têm amor ao Brasil, um amor
incondicional e absurdamente esperançoso, ao contrário das classes
intelectualizadas, que se acham muito inteligentes ao repetirem a sua
"preocupação" com o nacionalismo e o populismo e para as quais os
símbolos nacionais são coisa de "fascismo" e de "regime autoritário". Os
intelectuais não sentem amor e, como não conseguem entender o amor que
os outros sentem, atribuem o nacionalismo ao “medo” ou à “xenofobia”.
Para os pobres, a nação brasileira e a fé cristã são tudo o que possuem
para ligá-los a uma realidade melhor, superior, mais autêntica. Os
instruídos não precisam de pátria nem de Deus, para eles tanto faz, nada
os liga a nada, em sua permanente autossatisfação e sentimento de
superioridade. Os "ignorantes" podem não entender a sintaxe do hino
nacional, mas entendem perfeitamente o sentido inspirador e a beleza
profunda quando cantam "Brasil, um sonho intenso, um raio vívido de amor
e de esperança à terra desce". Os instruídos talvez entendam a
gramática (na hipótese de que, em suas escolas, a aula de análise
sintática não tenha sido substituída por doutrinação ideológica), mas
não fazem a menor ideia do que essas palavras significam.
Os instruídos não têm culpa, foi o sistema que os fez assim. Muitos
estão saindo da caverna, olhando o mundo pela primeira vez à luz do sol,
percebendo que tudo o que aprenderam até hoje era um mecanismo de
controle mental a serviço de um projeto torpe de poder. O povo já saiu
da caverna. O povo não sabe quem é Platão mas entende Platão e vive ao
sol da verdade. Os instruídos até ouviram falar em Platão, mas preferem
viver no escuro. O povo entende que qualquer expressão tem um contexto,
compreende que a realidade é algo muito mais complexa do que um slogan
politicamente correto.
O povo diz o que sente, não o que aprendeu que deve sentir. O povo
pensa. O povo está ainda livre do paupérrimo jogo de palavras
nominalista. O povo se relaciona com a realidade, não com as palavras, e
sua reação aos fatos e fenômenos resulta de sua experiência e de sua
razão, de uma complexa interação entre vida exterior e vida interior.
Os instruídos são todos eles materialistas, pois ensinaram-lhes que não
existe nenhuma realidade transcendente. O povo "ignorante", ao
contrário, sabe que existe a vida do espírito, sabe que existe a alma,
inclusive a alma de uma nação, e nisso está em companhia de todos os
grandes pensadores da história humana.
(*) Ernesto Araújo é Ministro das relações Exteriores do Brasil,desde 01-01-2019.