Fonte: BBC, 28-01-2019.
No
centro de Caracas, a capital da Venezuela, um edifício parece ter saído
de um filme de ficção científica. O Helicóide foi projetado para ser um
símbolo das ambições da Venezuela. O Helicóide - El Helicoide - foi
idealizado como símbolo de um país rico e promissor.
Atualmente,
no entanto, abriga uma das prisões mais violentas da Venezuela e
retrata o declínio de uma nação que está à beira do colapso. O Helicóide
foi construído nos anos 1950, quando a Venezuela, empurrada pelo lucro
das exportações de petróleo, sonhava alto.
Por
anos, grande parte do edifício permaneceu vazia. Mas, nos anos 80, o
governo começou a transferir algumas agências para o Helicóide, sendo a
mais importante o SEBIN (Serviço Bolivariano de Inteligência).
A
reportagem da BBC Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC,
conversou com ex-prisioneiros, familiares de detentos, advogados, ONGS e
também dois ex-agentes penitenciários para reconstruir pela primeira
vez seu interior. Eles nos pediram para proteger suas identidades porque
têm medo de represália do governo.
Edificio do Helicóide, no centro de Caracas
Quando
chegou ao Helicóide, em 2014, Mantilla diz que só havia 50 detentos.
Dois anos depois, já eram 300. Com o aumento no número de detentos, os
guardas tiveram de improvisar mais espaço. Salas comerciais, banheiros,
escadas e espaços projetados para serem lojas foram convertidos em
celas. Os prisioneiros as batizaram com nomes como Aquário, Tigrito e
Infernito.
Mas a pior de todas era
Guantánamo (em alusão à prisão que os Estados Unidos mantêm em Cuba).
"Era um antigo depósito de documentos", lembra-se Víctor, outro agente
penitenciário que trabalhou no Helicóide. "Tinha 12 m² e abrigava cerca
de 50 presos". Era quente, apertada e claustrofóbica. "Não havia luz,
água, privada, nenhuma infraestrutura sanitária ou camas", diz Mantilla.
"As paredes eram manchadas de sangue e excremento".
O
carcereiro Victor disse à BBC News Mundo que os prisioneiros podiam
passar semanas ali sem tomar banho, urinando em garrafas e defecando em
sacolas plásticas - que eles chamavam de "barquinhos". Mas os
maus-tratos não eram o único motivo para ter medo no Helicóide. Todos os
ex-prisioneiros e ex-agentes penitenciários que falaram com a BBC News
Mundo sobre suas experiências descreveram o uso sistemático de tortura
que o SEBIN empregava para obter confissões. Carlos, um ex-detento, diz:
"Eles cobriram minha cabeça com uma sacola. Fui violentamente agredido,
chutado e levei choques elétricos na cabeça, nos testículos e no
estômago".
"Senti uma humilhação imensa, impotência, vergonha e indignação".
Abusos de direitos humanos
Os
dois ex-agentes penitenciários que falaram com a BBC confirmaram a
ocorrência de tortura, mas negaram ter participado. "Vi pessoas sendo
agredidas, amarradas, suspensas por seus punhos em um corrimão de uma
escada e com os pés mal tocando o chão", diz Víctor. "Eles usavam um
carregador de bateria de carro com dois cabos conectados à pele dos
detentos para dar choques elétricos", acrescenta Manuel. "A tortura era
sistemática", acrescenta. "Era uma prática normal". Muitos desses casos
foram documentados por organizações de direitos humanos internacionais
e, em fevereiro de 2018, a Corte Penal Internacional abriu uma
investigação preliminar sobre violações de direitos humanos cometidas
durante os protestos.