Para Roberto Freire, a resistência ao sistema se deve ao 'atraso de se imaginar um salvador da pátria'
O
parlamentarismo voltou ao debate político como resposta à crise, ainda
que a viabilidade de implementação desperte ceticismo inclusive entre
entusiastas.
Na semana passada, o senador José Serra (PSDB-SP)
conversou com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), sobre a
instalação de uma nova comissão especial sobre sistema de governo.
Segundo Eunício, a comissão será instalada em agosto.
O
ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, tratou do tema com
o presidente Michel Temer há poucos dias e os dois ficaram de retomá-lo
em breve.
"Tem de haver uma redução dessa multiplicidade de
partidos para que o sistema se consolide. O nosso presidencialismo
esgarçou-se demais", observou Gilmar.
"Dos quatro presidentes pós-1988, só dois terminaram os mandatos. Há algo de patológico. Eu quero contribuir para a discussão."
O
Brasil, como os EUA, é presidencialista, sistema no qual o presidente é
chefe de Estado e de governo. No parlamentarismo, adotado em países
como Reino Unido, Portugal e Itália, o governo é comandado por um
primeiro-ministro escolhido pelo Poder Legislativo, que pode trocá-lo a
qualquer tempo.
A ideia de Serra é colocar em tramitação um
projeto de Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), senador licenciado e hoje
ministro de Relações Exteriores, para implementar o parlamentarismo a
partir de 2022.
"Meu plano é que, no próximo mandato, se faça a
transição, o que não significa misturar, fazer algum tipo de 'semi', mas
é reestruturar as carreiras", diz Serra.
Os cerca de 20 mil
cargos de confiança teriam de ser extintos, afirmou, senão, quando
houver mudança de primeiro-ministro, será necessário trocar todo o
pessoal.
O ministro Mendonça Filho (Educação), um dos
articuladores da reestruturação do DEM, que tem o parlamentarismo como
bandeira, afirmou que o novo sistema "consagraria maior nível de
governabilidade".
Atalho
Se quisesse, o Congresso
poderia dar ares mais palpáveis à discussão, que gira em círculos há
décadas no país. Uma PEC (proposta de emenda à Constituição) da Câmara
já foi aprovada em comissões e está pronta para ser votada em plenário.
De
autoria do ex-deputado Eduardo Jorge, à época no PT, com substitutivo
de André Franco Montoro (PSDB-SP) e Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), data
de 1995, foi questionada no STF e hoje mofa em alguma gaveta na Câmara.
"Passada essa crise e Michel Temer continuando no poder, a questão pode ter alguma vitória", disse Andrada.
Para
o deputado Roberto Freire (PPS-SP), o debate não se concretiza "porque
as pessoas defendem com receio de que não tenha viabilidade, e aí fica
apenas no ideal".
A resistência se deve, segundo ele, "ao nosso
atraso de ficar imaginando que vai se ter um salvador da pátria. Quem se
posicionou contra na Constituinte? O PDT, que imaginava eleger Brizola,
e PT, que imaginava Lula".
Mendonça Filho acrescenta ao rol de
dificuldades a "antipatia natural da opinião pública, que confunde
parlamentarismo com Parlamento e suas mazelas".
Mas, ele nota, o
sistema "tem uma vacina muito importante : o primeiro-ministro não
precisa fazer concessão ao populismo para governar", já que é eleito por
parlamentares.
Um dos argumentos contrários é a instabilidade se houvesse trocas frequentes de primeiro-ministro.
Freire
rebate. "Em Portugal, chamam até de geringonça, porque é um arranjo de
maioria. Se o partido que não faz parte do governo não votar a favor,
cai o governo, então ele é muito mais responsável, mais estável."
Em 1993, o parlamentarismo foi rejeitado em plebiscito.