Devemos a João Brígido as primeiras informações sobre a história da região do Cariri e, por consequência, o início da recuperação da memória histórica da cidade de Crato. Com efeito, fruto das pesquisas desse jornalista, foram publicadas no “Diário de Pernambuco, de Recife, em 1861 – na forma de folhetim – os capítulos que depois seriam reunidos em forma de livro (“ Apontamentos para a história do Cariri”) este publicado em 1888 pela Typografia da Gazeta do Norte, de Fortaleza, ainda na opulência da forma do governo monárquico.
Dir-se-ia que esta obra de João Brígido atravessaria como modelo ou padrão para as informações sobre a história de Crato, mesmo após os primeiros anos posteriores ao golpe militar de 15 de novembro de 1889, que derrubou a monarquia, exilou a Família Real e implantou a República no Brasil.
Entretanto, a partir dos anos da década 40 do século XX, historiadores vêm tentando reinventar a fórceps a memória desta cidade, sem obter a adesão do seu povo para este intento. Para tanto, passaram a divulgar o efêmero episódio da Revolução Pernambucana de 1817, em Crato, com sendo o maior acontecimento histórico desta cidade. Transformaram dona Bárbara de Alencar em ícone republicano e a promoveram a heroína. Mas nada disso obteve ressonância junto às camadas populares de Crato.
Por ironia, um filho de Crato, Padre Cícero Romão Batista -- antipático a uma minoria da elite desta cidade -- é hoje, provavelmente, o mais lembrado personagem histórico no nosso imaginário coletivo. O retrato desse padre – além de pequenas imagens de gesso dele – está presente nas residências mais modestas desta cidade. E elas são milhares! Aliás, pequenos monumentos ao Pe. Cícero já foram erguidos nas entradas de Crato. Um deles está fincado nas proximidades do viaduto que dá acesso a Juazeiro do Norte, no pátio de uma fábrica desativada. Outro, um oratório, existe logo no início da rodovia Crato–Farias Brito, após o bairro Batateira. Um terceiro, localiza-se no entroncamento da Avenida Thomaz Osterne com a rua que dá ao bairro São Miguel.
Na realidade, o imaginário popular de Crato concede mais importância ao episódio de fundação da Missão do Miranda, por Frei Carlos Maria de Ferrara, do que a muitos dos outros fatos históricos que tentam ser empurrados goela abaixo à população cratense. É o caso do carinho e veneração que a população tem pela imagenzinha da Mãe do Belo Amor. (ela é vista na foto à direita, em vitral existente na Sé Catedral. São Fidelis de Sigmaringa também está ao lado dessa imagem no mesmo vitral). Esta pequena imagem, juntamente com o monumento ao Cristo Rei, localizado numa praça de Crato, está preservada na imaginário popular como um símbolo, um ícone da cratensidade.
Outro caso é o título de “Vila Real”, cada dia mais assimilado pelo povo. Ele já denomina estabelecimentos comerciais e hoteleiros, além de empreendimentos imobiliários. Até o fato de o Crato possuir um co-padroeiro – no caso são Fidelis de Sigmaringa – caiu no agrado geral. A ponto de, recentemente, o bispo de Crato ter assinado um decreto oficializando este santo franciscano como o segundo patrono desta cidade.
E por falar na padroeira, a festa de Nossa Senhora da Penha continua sendo o maior evento social-religioso genuinamente cratense.
Eis aí, en passant, alguns símbolos reais da verdadeira cratensidade...
Procissão da Mãe da Penha 2013E por falar na padroeira, a festa de Nossa Senhora da Penha continua sendo o maior evento social-religioso genuinamente cratense.
Eis aí, en passant, alguns símbolos reais da verdadeira cratensidade...
(*) Armando Lopes Rafael é historiador.