O
general Pedro Labatut nasceu, em 1768, em Cannes, França, e
faleceu, em 1849, em Salvador, na Bahia. Este militar francês
participou das Guerras Napoleônicas, entre 1807 e 1814, tendo atuado na
Península Ibérica. Labatut combateu também na Guerra da Independência
dos Estados Unidos da América, ao lado do Marquês de La Fayette. Atuou,
ainda, na Colômbia, ao lado de Simón Bolívar. Finalmente, veio para o
nosso país – contratado no posto de brigadeiro pelo imperador Pedro I –
dada a escassez de oficiais experientes no exército brasileiro
recém-organizado e para ajudar na guerra da independência do Brasil.
Aqui, Labatut ordenou o Exército Pacificador, que combateu as tropas
leais a Portugal, na Província da Bahia e lutou na Revolução
Farroupilha, já no período regencial.
Em 7 de julho de 1832, a
Regência nomeou-o para chefiar uma expedição ao Ceará, com o objetivo
de prender Pinto Madeira e devolver a paz aos habitantes da província.
Chegou Labatut ao Ceará, no dia 23 de julho, trazendo 200 homens, quase
todos negros. Mas somente em 31 de agosto, veio ele ao teatro da Guerra
do Pinto, iniciando sua missão pela Vila de Icó. Encontrou a revolta
praticamente encerrada, graças ao empenho do presidente da província,
José Mariano de Albuquerque. Em setembro, Labatut já estava no Cariri,
fazendo seu quartel no Sítio Correntinho, (localizado este entre Crato e
Brejo Grande, segundo Gustavo Barroso, ou no município de Barbalha,
propriedade de Pinto Madeira, segundo historiadores caririenses). Dali
ele lançou uma proclamação aos revoltosos convidando-os à rendição,
mediante promessa de clemência. Ofereceu garantias a Pinto Madeira e ao
padre Antônio Manuel de Souza para estes se entregarem, o que ambos
fizeram, em 12 de outubro de 1832, com a promessa de serem enviados ao
Rio de Janeiro, onde teriam um julgamento imparcial.
Militar
experiente, Labatut logo sentiu o exagero das notícias chegadas à
capital do Império sobre a Guerra do Pinto. Acampado no Cariri,
constatou ele que Pinto Madeira, mesmo obtendo algumas vitórias, nunca
ultrapassou os limites de Icó. A capital da província, os portos
cearenses, a rota entre Aracati e Icó nunca saíram das mãos do
governador da Província e da Regência. Além do mais, Labatut não
precisou derramar uma gota de sangue cearense, pois a Guerra do Pinto já
havia sido vencida pelo governador da província, José Mariano. Tudo
isso tranquilizou o general Labatut, pois sua missão não necessitava
promover lutas e sim viabilizar o apaziguamento da população.
Foi o que ele fez, tendo oportunidade de cumprir, com isenção, sua
missão. Para evitar que os dois chefes rebeldes fossem massacrados por
seus inimigos do Ceará, enviou-os a Recife, sob a guarda de um oficial
de sua plena confiança. Em 14 de outubro, Labatut fez um equilibrado e
sereno ofício ao Ministro da Guerra da Regência, do qual destacamos os
tópicos abaixo:
“(...) Tenho a honrosa satisfação de ver quase
concluída a comissão que a Regência do Império, em nome do Imperador, me
há encarregado, sem derramar uma só gota de sangue brasileiro. Remeto a
V.Excia., por intermédio do presidente de Pernambuco, o ex-coronel
Joaquim Pinto Madeira e o vigário de Jardim, Antônio Manoel de Sousa
que, sob condição de conservar-lhes as vidas, e remetê-los para essa
Corte, se me vieram apresentar no acampamento de Correntinho, em virtude
de minha proclamação de 22 de setembro próximo passado, cuja cópia
ofereço a V.Excia. Eles vieram acompanhados de muitas famílias que foram
ao seu encontro nos desertos e montanhas por onde passavam. Estes
dissidentes, em número de 1.590, prontamente me entregaram as armas da
nação que empunhavam. Exmo.Sr., a maior parte das intrigas durante o
reinado do terror, que felizmente passou, compeliu estes povos a
hostilizarem-se de modo tal que geme o coração mais duro, à vista dos
incêndios, mortes arbitrárias e roubos praticados até pelas tropas do
presidente desta província (...)
“Como, pois, poderão ser julgados
os réus por juízes inçados da mesma opinião dos partidos que assolam a
província? Por isso rogo a V.Excia. se digne de atender ao meu último
oficio do Icó, em que, conhecendo cabalmente os males que acabrunham a
nova comarca do Crato, eu pedia juízes íntegros, justos e sábios por não
haver um só letrado, em toda ela, os de paz e ordinários são mui leigos
e pertencem a um e outro partido. (...)
“Estou pronto a executar
as ordens do governo supremo, conservando-os submissos como ora se
acham, em vista da brandura com que os tenho tratado, mas necessito de
juízes com hei demonstrado. (...) A intriga, desgraçadamente, deu vulto a
cousas em que nada ofendiam as leis. É falso, como aqui se dizia, que
Joaquim Pinto Madeira proclamara e defendia a restauração e queria
reproduzir aqui as cenas sanguinolentas do S. Domingos francês
(referia-se à revolta dos escravos negros no Haiti). O governo mandando
juízes letrados imparciais conhecerá a fundo os verdadeiros culpados. O
coronel de milícias Agostinho Tomás de Aquino e o tenente de primeira
linha Antônio Cavalcante de Albuquerque (ambos das tropas do presidente
da província) cometeram horrorosos atentados contra os direitos civis,
vidas e propriedades de seus concidadãos, sem escapar sexo nem idade.
Seria um grande benefício para a humanidade atrozmente ofendida, e para a
tranquilidade da Província, que V. Excia. os mandasse recolher à Corte e
devassar as suas condutas. Fez-se guerra de bárbaros, mataram-se
prisioneiros, queimaram-se casas, legumes, mobílias, roubaram-se gados,
confiscaram-se os bens dos dissidentes.
“Deus guarde a V.Excia. Sr.
brigadeiro Bento Barros Pereira, Ministro da Guerra – Pedro Labatut,
general comandante das tropas do Ceará. Crato, 14 de outubro de 1832”.
Como se viu, a carta do general Labatut ao Ministro da Guerra
do Brasil constituiu-se numa defesa de Pinto Madeira. Desnecessário
detalhar o quanto isso desagradou aos liberais de Crato, ao presidente
da Província do Ceará, José Mariano, e ao padre José Martiniano de
Alencar, no Rio de Janeiro.
Entretanto, os fatos históricos
demonstram que foram cruéis tanto as forças legais como as tropas
lideradas pelo caudilho do Cariri.
Citações do trabalho “Um general francês em terras do Crato”
FIGUEIREDO FILHO, José de. História do Cariri–Volume III. Edição da Faculdade de Filosofia do Crato, 1966. pags. 34-35.
Texto e Postagem: Armando Lopes Rafael
Texto e Postagem: Armando Lopes Rafael