Nas democracias antigas, com destaque para aquela que se exercitava na Grécia ao tempo de Sólon e Clístenes, nas Ágoras de Atenas, as decisões político-governamentais, a despeito do controle do Supremo Conselho do Areópago, eram discutidas, votadas e aprovadas diretamente pelo povo. Entenda-se povo, àquela época, somente os nobres, os clérigos e burgueses, já que os seres humanos desprivilegiados de fortuna e de títulos, notadamente os escravos, eram apenas COISAS, ou RES, não passando de uma propriedade, instrumentos animados de livre negociação. Estes não participavam do processo de democracia direta. Com o evoluir das civilizações e o crescimento geométrico da população, aperfeiçoando-se dia a dia o pacto social de que já falava Platão, estudado por Thomas Hobbes e desenvolvido por Jean Jaccques Rousseau, começou a se esboçar as democracias modernas, culminando com o sistema tripartido de Poderes, arquitetado por Montesquieu, em cujo protótipo se insculpe a representação popular nos Poderes Legislativo e Executivo, ou seja, é o povo, através do sufrágio universal, quem nomeia os Vereadores, Deputados, Senadores, Prefeitos, Governadores e, no caso do Brasil, o Presidente da República, para representá-lo e tomar as decisões deste povo, nas Câmaras Municipais, nas Assembléias Legislativas, na Câmara Federal, no Senado, nos governos dos Municípios, dos Estados membros e da União Federal.
Essa representação, essa delegação de poderes, concedida pelo povo, chama-se mandato eletivo. É uma procuração que o povo outorga a essas pessoas para, em nome desse povo, no caso dos Vereadores, Deputados e Senadores, votarem as leis, exercerem o controle externo do Poder Executivo, e, no caso dos Prefeitos, Governadores e Presidente da República, promoverem a segurança pública, a ordem econômica, a ordem social, a seguridade social, a educação, a cultura, enfim, tudo o que for necessário para atender à teleologia do pacto social. Lamentavelmente, no Brasil, as pessoas alçadas aos Poderes Legislativo e Executivo, Vereadores, Deputados, Senadores, Prefeitos, Governadores e o Presidente da República, assimilam que são donos do mandato eletivo e abusam dos poderes que lhes foram concedidos pelo povo através do voto. Passam a usar este poder como se fosse uma procuração em causa própria, para contrair empréstimos faraônicos e impagáveis para suas empresas particulares, para renunciar receitas públicas, ou conceder benesses fiscais a grupos econômicos, para favorecer concessões públicas, referendar licitações e contratos espúrios, para aumentar, ou diminuir alíquotas e tarifas, ao bel prazer de conveniências particulares, para desviar recursos orçamentários, e tantas outras improbidades e infrações político-administrativas cujo elenco de falcatruas não cabe neste nosso espaço.
Numa República como a do Brasil, onde a corrupção é um elemento transgênico no genoma moral dos responsáveis pelo funcionamento do organismo administrativo público, seria de boa política constitucional, a instituição da figura do RECCAL, possibilitando ao povo/eleitor cassar do Poder, a qualquer tempo, aquele Vereador, Deputado, Senador, Prefeito, Governador, Presidente da República, que não honrasse a representação popular, devolvendo à população o respectivo mandato eletivo. Recall é uma palavra da Língua Inglesa que tem significado aproximado de “chamar de volta” e, no linguajar técnico-político do Direito Constitucional, conceitua-se como o direito que o eleitorado tem de revogar o mandato político de um candidato eleito, substituindo-o por outro seu representante, antes do término do mandato, eletivo daquele. Atualmente, diante da insustentável crise de improbidade vivida pelo Senado Federal, como se já não bastasse a corruptocracia que ameaça a República como um todo, o Conselho Federal da OAB retoma a luta pela aprovação urgente no Congresso Nacional do mecanismo do RECALL, que possibilita a cassação direta pelo povo do mandato eletivo dos políticos que traíram a vontade popular e fazem dos seus cargos um instrumento de enriquecimento criminoso em detrimentos dos verdadeiros e urgentes interesses da Nação.
A figura do Recall é instituída através de Emenda Constitucional proposta por um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados, ou do Senado Federal e; ainda, pelo próprio Presidente ad República; ou por mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação.
É chegada a hora de todos os brasileiros não-corruptos se associarem a esta campanha patriótica e timoneira da OAB , no sentido de ser discutida, votada aprovada e promulgada a Emenda Constitucional do RECALL, fazendo valer, efetivamente, a soberania popular, trazendo o País para a senda da seriedade Administrativa pública.
Por: Dr. Aglézio de Brito