Permanência dos moradores na zona rural de Jardim para colheita do pequi é uma tradição que atravessa décadas
Jardim. Um ano de safra recorde de pequi no Cariri. Essa já é a previsão dos catadores, que, aos poucos, começam a montar os seus barracos de palha e taipa em plena Serra do Araripe. A morada é de pelo menos três meses, período em que se transferem para a mata nativa, a fim de percorrerem todos os dias mais de 30 quilômetros em busca do fruto, para comercializar à beira da CE-060, entre os municípios de Jardim e Barbalha. É comum, durante esta época do ano, se encontrar barraqueiros à beira das estradas, em cima da serra, comercializando o produto.
A permanência dos moradores, em sua maioria do Sítio Cacimbas, pequena vila de moradores da zona rural de Jardim, no acampamento dos pequizeiros, é uma tradição que atravessa décadas. Famílias inteiras se instalam à beira da estrada e lá passam a residir. Já foi criada até entidade para melhor organização do grupo, a Associação dos Catadores de Pequi.
Este ano, cerca de 30 famílias deverão aportar na área. Ano passado, esse número caiu pela metade em virtude da pequena safra. Começou pouco e acabou rápido. Não houve muita variação no preço do pequi ano passado, bastante requisitado pelo caririense neste período. Presença certa no prato do sertanejo, o baião-de-dois ganha um tempero especial. É gosto tradicional.
Duas espécies
No Cariri, há dois tipos de pequi. O do Arisco é um fruto um pouco maior, cuja safra começa um pouco antes do da serra. Também é da região, mas a safra já está quase no fim. Aí vem a variação da espécie, no alto da Chapada, em áreas mais úmidas.
Segundo o presidente da Associação dos Catadores, Isteli Bernardino, o pequi da serra apresenta maior teor de óleo. Por conta disso, a fabricação do óleo ou azeite de pequi também aumenta neste período. Essa é a grande razão da permanência dos moradores. Eles passam a fabricar no período em que a safra atinge o seu pico, em fevereiro.
Conforme o catador Vicente Bernardino, que desde criança começou a ir para o acampamento, ano passado, o preço do óleo chegou a custar R$ 36,00. Este ano, a previsão é que chegue aos R$ 6,00. Há compradores que vão ao local para requisitar uma compra mais significativa de pequi, conforme o catador, e encomendam a fabricação do óleo, chegando a até 400 litros. “No máximo, a nossa produção por conta própria, sem encomenda, pode chegar a 180 litros por mês, porque vendemos o pequi e o óleo juntos”, diz Vicente.
Rotina árdua
Todos os dias, para quem se instala na floresta, acontece o mesmo ritual. Os catadores saem de casa por volta das 3 horas da manhã. Percorrem 18 quilômetros pela manhã e à tarde, muitas vezes, voltam a repetir o percurso. Um trabalho árduo, que segundo Isteli, não compensa se a venda for abaixo de R$ 1,00. “É um sacrifício muito grande para todos nós e passamos a sobreviver da colheita. Tem dia que chego a parar carro na estrada para pedir dinheiro para comprar uma lata de leite”, lamenta.
O grupo é formado por agricultores, em sua maioria. Mulheres e filhos vão junto na tarefa de auxiliar na colheita. As barracas de palha servem de abrigo. Uma das preocupações dos catadores este ano é quanto ao abastecimento de água na região. As crianças também necessitam de transporte escolar.
Alguns catadores chegam a faturar cerca de R$ 400,00 por mês com a colheita. Além de manter a família, o dinheiro é utilizado para o pagamento de plantadores do roçado, que não fica esquecido, já que a safra coincide com o período de chuvas na região. A festa do pequi encerra a safra. Este ano deve acontecer no dia 15 de março. Um momento de celebrar uma tradição de décadas.
ELISÂNGELA SANTOS
Repórter
ENQUETE
Qual a importância do pequi na sua vida?
Cícero Pedro da Cruz
34 ANOS
Catador
A gente sobe para cá para pagar as contas. Pagar o nosso roçado por conta do pequi, uma necessidade financeira.
Wandeilson Bernardino
20 ANOS
Catador
Para mim é uma garantia de ganho para manter a família, pagar as contas, e vem de uma tradição.
Mais informações:
A Comunidade dos Catadores fica na CE-060, na divisa entre os municípios de Jardim e Barbalha (à beira do asfalto), na Floresta Nacional do Araripe
Fonte: Jornal Diário do Nordeste
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